quinta-feira, 29 de julho de 2010

QUE AMORES TERMINAM NO ESCURO...

[GRAVANDO]
Ouvi dizer que o Canal Viva vai reprisar "Hilda Furacão", felicíssima adaptação de Glória Perez da obra de Roberto Drummond. A minissérie foi exibida em 1998 na Rede Globo e eu acompanhei cada detalhe, cada gesto, cada mudança dessa trama incrível. Quando ouvi da reprise, lembrei da primeira cena, que apresenta os três personagens: Roberto, narrador da história, queria fazer a revolução que mudasse o mundo. Aramel (o belo), queria ser astro de cinema e Malthus, queria ser santo, ia seguir a vida casta. Além da cidadezinha mineira fictícia de Santana dos Ferros, esses três jovens tinham em comum a palavra: sonho.
Naquela época, eu me identicava muito com o Malthus. Era católico fervoroso, praticante, "quase" santo (pelo menos aos olhos dos que me viam assim). Na verdade a santidade só existe do ponto de vista de quem a cria, no mais, tudo é profano, principalmente viver. No começo de minha juventude, tive uma fase meio Aramel. Fui estudar cinema, comecei a trabalhar em TV e me perdi nesse "estrelato", tudo era fantástico, tudo era magnífico, mas como toda boa ficção essa fase hoje só existe como registro em betacam de um passado importante (de vislumbre) que está muito bem arquivado em minha memória, com todo o respeito que o passado evoca. Também passei pelo Roberto. Achei num dado momento que eu podia mudar o mundo, as pessoas, adaptar as coisas a mim, ao meu querer, ao meu prazer, quem nunca se acometeu disso? Felizmente cheguei onde precisava nesse momento, acho! Numa personagem que era pano de fundo, mas que hoje faz todo sentido. Cheguei à Hilda, que no começo tinha sobrenome Muller (pomposo) mas que virou (e decidiu virar) Furacão! Pra isso, ela teve que abrir mão da casa de luxo dos pais, do casamento arranjado com um belo filho de fazendeiro, do não ter que trabalhar, teve que abrir mão da identidade medíocre que inventaram pra ela, mão de si mesma, da sua própria "sorte". Foi morar no Maravilhoso Hotel e se apresentava no Montanhês Dance. Conheceu a zona boêmia, experimentou no mais profano do sagrado um sabor que nem mesmo a fé de Malthus jamais conseguiu alcançar. Da sacada do Maravilhoso atingiu  fama invejável à Aramel e fez uma revolução em sua vida que, certamente, Roberto não teria coragem. Que o genial Drummond perdoe a intimidade com seus personagens, foi inevitável encontrá-los no caminho. Também conheci minha Madame Janete, a mística. Sentei frente a ela. Nunca a tinha visto, mas ela me conhecia desde criança olhando minha sorte. Lembrei que para Hilda foi dito: "Ninguém foge do seu destino, o que Deus risca, ninguém rabisca". Ainda não sei quem mais vou encontrar pelo caminho, que metamorfose é essa, e onde  tudo isso vai dar, mas... se o tal destino realmente não está em nossas mãos por completo, resta colocar a mão no leme (frase da minha mística) e remar com a força que se pode. Um dia chego ao Maravilhoso e ao Montanhês, quem sabe...
[CORTA]

Um comentário:

Domênica Mantel disse...

Esse texto prova que sensibilidade não tem sexo. Pelo menos, não quando a mão escreve como palavra única que começa na alma e termina no gesto de "publicar". Desabafo lindo. Confissão esperançosa sem a pieguice do sentido vazio. E eu, daqui, sigo como espectadora fiel, pois sei que "ler" você é sempre um chegar mais perto do "maravilhoso" e do "montanhês".
Beijo, Vinyl!